quarta-feira, 25 de outubro de 2017

A convivência humana e a maldade contra os animais


Em 1997 eu estava com quase 20 anos de formado naquela época e achava que já tinha visto muita coisa triste na profissão.  Trabalhei nesta época em uma fazenda de criação de gado leiteiro, búfalos e suínos no município de Braço do Trombudo próximo a cidade de Rio do Sul em Santa Catarina, e tive acesso a uma das maiores barbaridades intencionais que eu vi um ser humano cometer contra um animal.

Fui chamado por um amigo meu agrônomo, para fazer alguma coisa por um cão que estava alguns dias, sofrendo, deitado no fundo escuro de um estábulo de ordenha com queimaduras de 3º grau em ambos os membros posteriores e a cauda, o animal teria ficado com o fogo em sua pele e rolando no chão por cerca de 5 minutos até que seu dono conseguisse entender a distância porque seu cachorro rolava e gritava tanto perto da sua cerca de divisa com seu vizinho. Chegando lá o cheiro de óleo diesel na pele denunciava que alguém tinha expulsado aquele cão e jogado na hora que ele correu óleo diesel na suas costas.



O motivo de tudo era que o cão sentindo o cheiro de churrasco teria invadido a casa de quem teria feito esse absurdo e tentado apanhar algum pedaço de carne, mas não deu certo. Na época o proprietário tinha deixado o cão ficar como estava só colocando água e comida para ele no estábulo onde eu o encontrei 9 dias depois magro e com uma enorme bicheira facilmente adquirida nas condições de curral onde ficou todo esse tempo.

Voltei então até a fazenda onde trabalhava e busquei anestésico, antibiótico, anti inflamatório combinado a analgésico além dos meus materiais cirúrgicos e fiz o serviço de debridamento da pele morta e retirada das larvas que invadiam até a musculatura da coxa do animal.

O proprietário parecia que não sabia o que fazer ou não tinha como pagar para resolver o problema, só esperava que ele morresse, pois não tinha feito nada pelo animal todo esse tempo, ele só me disse que tinha “dó de ver o animal daquele jeito” e nem chegava perto dele pois isso o faria lembrar do vizinho contra o qual ele já tinha tido problemas por ter destruído com fogo uma cerca que ele fez e que estaria errada pela planta original das duas propriedades. Consegui depois que toda a ferida foi debridada e limpa que ele tratasse do seu cão em local mais adequado pois teria chance de salvar o animal.

Cento e trinta dias depois visitei o animal e bati novas fotos, ele tinha engordado bastante mas devido a retração da cicatriz de pele seria necessário uma cirurgia corretiva para fazer o cão apoiar o membro. Quando expliquei a situação ele me ofereceu o cão para que eu o levasse embora para Minas (pois àquela época eu estava retornando para Betim) para trata-lo e ficar com ele. Como eu estava voltando de ônibus e com bastante bagagem não poderia assumir esse translado. Com muito pesar pensei no pior....

E o pior aconteceu. Dias depois já em Betim, perguntei ao meu amigo que havia me levado naquela fazenda onde o cão foi queimado, ele contou que antes que o dono do cão cometesse algum crime contra seu vizinho decidiu atirar nele para não vê-lo mais pulando com uma perna no ar. Ele dizia que o cachorro o fazia lembrar do vizinho e para não atirar no vizinho atirou no cachorro.

Passados hoje 20 anos, pois ano que vem faço 40 anos de profissão, ainda guardo comigo todos os detalhes deste caso muito sofrido que mostra bem a nossa rotina profissional inglória bem como a triste realidade da convivência humana.



Dr. Dilton Trivelli - CRMV-MG 1544

Telefone: 3532-4684 / 3511-6033 / 99909-6257
Rua do Rosário, n° 1080 - B. Horto - Betim MG

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